Para falarmos da irmã,teremos que fazer uma pequena visita ao passado,à casa dos avós e à meninice de nossa menina.
Ainda em Manhumirim(o trem não fazia parte de suas vidas),a nossa menina de cachos,com cinco anos,foi agraciada com um presente de Deus e de seus pais:uma irmãzinha,linda e meiga,a quem foi dado o nome de Teresinha Maria,em homenagem à santinha de devoção da mãe.,que fazia parte da irmandade de Sta Teresinha do Menino Jesus.E a mãe,piedosa,contava-lhes a história da santinha e elas se emocionavam com a beleza desta e os sacrifícios a que se submetia.
O nascimento da irmã foi uma alegria para nossa menina dos cachos.Só lamentava o tamanho da irmã...como brincar com ela,queria tanto uma companhia...
......mas gostava de exibí-la às visitas,como se fora uma boneca,um novo e precioso brinquedo...
Era um encanto de criança,sorria para todos e dificilmente chorava...rostinho redondo,narizinho arrebitado e cachinhos castanhos.Com todos estes atributos a todos conquistava e nossa menina de negros cachos,alegre,porém geniosa,sentiu-se um pouco preterida,principalmente no carinho do pai,a quem muito amava e de quem sentia um enorme ciume.
Por sua natureza e seus efeitos, o ciúme se aproxima da inveja. Porém, entre ciúme e inveja permanecem algumas diferenças. Na inveja, sentimos que outros possuem um bem que desejamos para nós, enquanto no ciúme entendemos um bem que julgamos nosso e que não desejamos ver partilhado com outrem. (Pierre Charon)
Porém o tempo passou,célere e absoluto e vamos encontrá-las,já maiores ,em Muriaé,estudando no mesmo colégio e se sentindo mais próximas,apesar da diferença de idade que as separava...a irmã era tímida e gostava de ficar em casa,brincando com suas bonecas e suas mobilinhas de casinha.Uma coisa possuíam em comum:ambas gostavam
de ler e de estudar (a irmã, mais que ela ,estudava muito),de escrever,de música e de cinema.Aos domingos,após o almoço,a matinê era sagrada.Alguns filmes de que gostaram muito:
-Cantando na chuva
-As neves do Kilimanjaro
-Luzes da Ribalta
-Ivanhoé,o vingador do rei
-A princesa e o plebeu
-A um passo da eternidade
-Lili
E vários outros,naquele cinema de interior,as faziam vibrar e sonhar com um mundo distante e iluminado,com seus astros e estrelas inatingíveis.
E sonhavam muito as meninas daquela época...mergulhavam nos livros de M.Delly e viam a vida com óculos cor de rosa...príncipes encantados e galãs de Hollywood,Bonequinhas de Luxo e Noviças Rebeldes,alimentavam seus sonhos e sua imaginação...com suas saias rodadas rodopiavam em grandes e majestosos salões... suas sandalinhas de saltinho dois e meio as conduziam a um mundo ideal,utópico talvez,mas para elas,as fadas e princesas de outrora,legítimo e realizável.
Quando foi que o sonho acabou?
Biblioteca das Moças foi uma coleção de romances publicada pela Companhia Editora Nacional, no Brasil, entre 1920 e 1960, especializada em literatura para jovens mulheres. A coleção era composta por cerca de 180 volumes, compreendendo romances de vários autores, a grande maioria assinada por M. Delly. Publicados entre 1920 e 1960 pela Companhia Editora Nacional, de São Paulo, com a reedição de alguns exemplares nos anos 80. Os romances geralmente eram ambientados na França e possuíam enredos com estrutura bem definida[1]: o herói nobre e rico e a heroína plebéia e pobre, perfazendo uma trama complexa que finalizava com o casamento feliz, tal qual nos contos de fada. O casamento era apresentado como a redenção da mulher, e todos os romances terminavam com o encontro do herói com a "mocinha".
E as duas irmãs,um belo dia,receberam a notícia:um novo bebê estava a caminho,e a mãe,que já não era tão nova,estava a inspirar cuidados.Uniram-se mais ainda,uma com quinze,a outra com dez anos,em uma tarefa:cuidar da casa,não deixando que a mãe se sobrecarregasse .E foi a avó,a encarregada de ensinar às duas as lidas da casa,varrer,encerar,lavar a louça e as PANELAS!!!Ai, que esta era a pior parte, mas onde encontravam uma forma de brincar(já haviam lido Pollyana e praticavam o "jogo do contente")...tinham que buscar cinza de arroz em um grande armazém e as pilhas de cinza (altíssimas e perigosas,pois havia brasa embaixo) eram ótimas para se escorregar,mornas e macias.Deus as protegia e nunca se queimaram.
Todas as noites tomavam guaraná e dividiam a garrafa irmãmente,colocando-a contra a luz para não errarem.Elas se amavam,muito,mas havia também momentos de briga,que a mãe resolvia,ternamente, na base do beliscão e do castigo.
E nas férias iam para a praia,ou para Fervedouro,uma cidadezinha pequena onde havia um hotel com uma piscina de água mineral,corrente,na qual a irmã aprendeu rapidamente a nadar...e ela,com seu pavor à água,nem entrava.
FERVEDOURO_MINAS GERAIS-Laudemar Martins Fonseca |
Novamente interromperei o fluxo da narrativa.Voltarei daqui a uma semana...aguardem.