Memórias de uma senhorinha / DESPEDIDAS
E mais uma despedida se anuncia na vida de nossa senhorinha... outra plataforma,outra estação... mais uma tristeza para o seu coração, fragilizado por seu estado e já desacostumado da palavra adeus.
Seu pai foi transferido para o Rio de Janeiro, sonho antigo e acalentado por sua mãe, mas neste sonho ela não figurava, teria que ficar em sua casa, com o marido, o filho e já preparando o novo enxovalzinho do bebê que estava para nascer...
Como descrever o seu estado de espírito, ao receber a notícia?Decepção, angústia, frustração, desilusão e , ao mesmo tempo a alegria por saber que os pais estariam realizando um sonho... sentimentos contraditórios a invadiam e não sabia se deveria rir ou chorar... a criança, que habitava o seu interior, chorava, mas a senhorinha, adulta e compenetrada, demonstrava uma esfuziante alegria e planejava, com eles, os detalhes da mudança.
Coração partido não aparece, não sangra, nem se manifesta... e o dela estava partido em mil pedaços, não haveria cola capaz de emendá-lo... só mesmo o tempo poderia amenizar aquela dor.
Não mais a Rua São Pedro, não mais as brincadeiras com o pai, não mais seu quarto hippie com seus "livros, seus discos e nada mais."
O acender das luzes da realidade lhe fora duro, o sonhar era proibido, o "laissez faire,laissez passer, le monde va de lui même"(dito preferido de seu pai),também.Por entre os cílios guardava segredos e estendia nas janelas rendadas da alma as ilusões infantis.
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E o tempo, implacável senhor, seguiu a sua trajetória e ela "com seu vestido cada dia mais curto", viu chegar o dia da partida de sua família... se sentia órfã, ao lhes dar o adeus sofrido e machucado, mas segurou a dor dentro do peito e os viu partir, abraçada ao filho, naquela noite fria e triste... o trem apitou e selou a sua sentença.
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Nova vida e novo contexto ... afinal, um filho é uma planta, há que se esperar brotar...
No outro parto, ela, que havia sofrido as dores com total despreparo e imenso desatino , havia prometido a si mesma que, de outra feita, não sentiria nenhuma dor. Na revista Cláudia, havia lido sobre um miraculoso método de parto sem dor e, desde então, só pensava em encontrar o livro que abriria para ela as portas deste método. Pediu ao cunhado, que morava no Rio e estudava Direito, que , em suas incursões por livrarias, procurasse o milagroso livro. Para sua grande alegria, ele o encontrou e trouxe para ela...foi uma alegria enorme! O livro se chamava " Parto sem Dor"e seu autor , o Dr.Pierre Velay, afirmava, com todas as letras, que era possível se abolir totalmente a dor do parto, praticando os exercícios que ele, passo a passo, ensinava.
Fazia daquela prática a sua religião, a sua esperança, a sua tábua de salvação...sua carência, sua saudade, sua infinita tristeza, se transformavam em energia canalizada para um só objetivo: ter o seu filho sem sentir dor. Todos que a viam tão centrada nesta prática de relaxamento, controle da respiração, caminhadas e vários exercícios, achavam que era uma infantilidade, um sonho impossível...
Seu médico ainda era o querido Dr Evaristo, com sua cabeleira branca e sua fisionomia paternal... a enfermeira era a mesma do primeiro filho e riam, ambos, daquela sua obstinação em fazer aquelas paradas para a respiração, não acreditavam nem um pouco naquele método. Mas tudo correu bem e nossa amiguinha não sentiu mesmo a menor dor... seu filho nasceu e ela o recebeu com um sorriso nos lábios. Seu nome, Carlos Augusto e era um bebê forte e grande, calmo e tranquilo, nascido de um parto sem dor.
Os pais chegaram para conhecer o neto e se maravilharam ao ver como a sua menina estava bem disposta, alegre e sorridente.
Eu estou indo, mas voltarei na próxima semana...aguardem.