E ,em uma chuvosa manhã de março ,nossa Senhorinha foi chamada à Delegacia de Ensino de São João Del Rey , à qual pertencia a escola de Dores de Campos...apreensiva e preocupada , muniu-se de sua pasta e para lá se dirigiu, naquele velho ônibus e naquela esburacada estrada.
Infelizmente, nem suas palavras e nem suas lágrimas foram suficientes para mudar o imutável. Era uma decisão superior, amparada por uma lei e nada do que ela dissesse, nenhum argumento poderia modificar o irreversível. O que poderia fazer além de aceitar e abandonar todos os seus sonhos e tudo aquilo que havia planejado para a sua vida. Mergulhada em uma tristeza sem tamanho, voltou para a sua casa e empacotou todo o seu material de trabalho, empacotando junto a história de treze crianças , vítimas de um sistema injusto e cruel , autoritário e sem noção do mal que lhes seria causado...
Foram dias de muita amargura e a nossa Senhorinha tomou o único caminho que lhe parecia razoável...entrou em licença sem vencimentos e foi ao encontro de sua querida Drinha no Triângulo Mineiro, mais precisamente em Iturama. Uma viagem longa, com bastante tempo para pensar e se refugiar na história da Baronesa...
"por vezes sentimos que aquilo que fazemos
não é senão um gota de água no mar
mas o mar seria menor se lhe faltasse uma gota"
Madre Teresa de Calcutá
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E a Baronesa estava , de igual modo, triste e amargurada...sim, vieram tempestades,dilúvios de lagrimas de tristeza e desesperança...sentia-se desvivendo e sua alma de menina sonhadora se oprimia enquanto relembrava o sonho que fora, o encantamento que lhe trouxera aquele amor...
..
... havia enviado uma missiva para o amado, colocara todo o seu amor em cada palavra e , ainda não recebera resposta.
A costureira trabalhava diariamente na confecção do enxovalzinho e de novos trajes para a Baronesa. Belíssimas peças surgiam de suas habilidosas mãos, dignas de uma aristocrata...batas bordadas em fino linho, saias longas e drapeadas , vestidos em seda e renda. Toalhas em crivo já enfeitavam a casa, rosas em belas jarras se viam sobre os móveis. E ela, Alice ( era o nome da baronesa, lembram-se?), andava pela casa e se imaginava feliz com o seu amado e com sua filhinha de cachinhos dourados. E os dias corriam nesta espera e a saudade era a sua companhia diária. E ela andava em compasso de espera, sem poder adiantar o tempo, sem poder modificar o relógio. E olhava para dentro de si e para a menina que um dia havia sido...dos sonhos sonhados, aquele de encontrar um príncipe como nas histórias que a encantavam, era o mais desejado. Seria querer demasiado?
Fazer da interrupção um caminho novo.
Fazer da queda um passo de dança,
Do medo uma escada, do sono uma ponte,
Da procura um encontro.
Fernando Sabino
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E enquanto a nossa senhorinha imaginava, o ônibus chegou ao seu primeiro destino, Uberaba. Dali seguiria para mais sete longas horas de viagem...mas eu devo deixá-los e retornarei em um outro dia...com certeza!
Boa noite!!!
Leninha Brandão
10 comentários:
Adorei ler
Votos de um feliz fim de semana.
Muito obrigada, meu amigo Poeta! Um feliz e abençoado fim de semana para si também!
Boa tarde de paz, querida amiga Leninha!
Ler seu conto que da um lindo livro e restaurador.
Gosto da doçura da época,da delicedeza das suas palavras. Parece uma nini novela.
Imagino ao ler, os personagens, os bordados do enxoval... Ate se parece a foto com um pano de prato de adorno que tenho.
Muito obrigada por alegrar minha tarde fria no sudeste.
Tenha um excelente final de semana!
Bjm carinhoso e fraterno de paz e bem
Roselia querida,
Ler as suas palavras me enche de encantamento e grata alegria. Obrigada por seu carinho e por sua delicada atenção. Estou também no sudeste, porém não está frio na minha região serrana sempre tão fria.. Um beijo carinhoso e um abraço grande pra você, amiga.
Sinto uma revolta tão grande com o sistema que desde sempre parece querer estancar as gotas de humanidade, de construção real de um mundo melhor para todos...Imagino sua dor sendo um agente de transformação na educação. Triste.
Que ansiedade da baronesa Alice, tão jovem e cheia de sonhos...Tomara que o futuro tenha trazido alegrias aos seus dias de espera.
Amei ler, Leninha, um ótimo domingo!!
Dalva querida,
O meu domingo se iluminou ao ler as suas palavras...é bom sentir a solidariedade mesmo após tanto tempo, pois ao escrever senti a mesma dor da época. Foi realmente um golpe muito profundo em meus sonhos e ensejos de uma vida melhor para aquelas e para outras crianças que viriam no futuro e foram espoliadas de seus direitos tão legítimos.
Quanto à baronesa Alice terá a sua recompensa de sua espera tão longa e tão sofrida. Afinal, na ficção mais antiga, os finais românticos predominavam e sempre havia um "happy end"...
um domingo muito feliz para você também, minha querida!
Bjssssssss
Querida Leninha
Que surpresa boa!
Voltou e encantou! Por cá, passa-se o mesmo, no que diz respeito ao ensino.
Imagine que até há Cursos de Línguas...só com Língua Portuguesa, no último ano de Acesso ao Ensino Superior!!!
Fico à espera de notícias da Baronesa.
Um beijinho
Beatriz
Muito querida amiga Beatriz,
Gratidão por suas palavras, gratidão por seu sentimento expresso e recebido com todo o carinho de meu coração. De tão longe sentes e participas da dor da Senhorinha.
E a baronesa brevemente dará notícias, minha amiga.
Um beijo carinhoso
Não, minha doce Leninha, não era pedir demasiado quando o que se quer da vida não é mais que justiça e complacência para quem merece e faz por isso.
Hoje há um paralelismo entre a história da nossa Senhorinha e a nossa Baronesa.
A viagem das duas encontram obstáculos no caminho.
Quando a nossa Senhorinha se dá sem reticências à sua profissão com amor e o mesmo não é retribuído ou acarinhado, a dor da injustiça é profunda. Não admira pois, que a reacção seja se incompreensão e um tumulto dentro do peito.
A sociedade não se compadece com a fragilidade dos fracos. O fim último é sempre o economicismo.
Mas já viste como o teu tempo se repete hoje com as mesmas desculpas?
Fica-se longe de todo o mundo porque os que amam e se preocupam com o outro são casos que não fazem crescer - assim pensam os políticos- a sociedade.
Tal como a baronesa, esperamos sempre, já que a esperança é a última a morrer.
Hoje a carruagem da vida da Senhorinha e da baronesa, abrandou o ritmo para parar no próximo cais onde há sempre algo que espera.
E eu vou esperar porque sei que há sempre um amanhã e porque ler-te é reviver, é saborear, é pensar. Ensinas sempre!
Um grande e carinhoso beijinho para ti!
Minha doce e meiga amigairmã Manu,
Ler-te e sentir a forma pela qual partilhas os momentos da nossa Senhorinha me emociona sempre, deixando o meu coração acarinhado e agradecido. Gratidão imensa, minha querida!
Sei que, infelizmente, tudo continua da mesma maneira... os mais frágeis são sempre "atropelados" pela ganância dos poderosos.
Ainda bem que a nossa amiguinha era jovem e conseguia superar tais contrariedades. O sorriso habitava o seu coração e , a tristeza não se alojava em seus cabelos. Sofreu pelos alunos e por não ter forças para defender os seus direitos.
Uma nova página se abrirá em sua vida...ela era uma camaleoa , lembra-se?
Um beijo carinhoso, minha querida!
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